Era uma vez, em uma terra não tão distante, um senhor muito rico, porém muito solitário. Sua riqueza era facilmente explicada, afinal ele possuía várias propriedades, onde produzia o mais valioso dos frutos: a música. Entretanto, com a mesma facilidade pode ser explicada sua solidão. Ele era tido por muitos como pão duro e egoísta, detendo para si grossa fatia de tudo que era produzido em seus campos. Daí, todos o apelidaram de Avarento.
Ano após ano, ele tratava de esmagar categoricamente cada suposto concorrente que surgia. Cada um que oferecesse uma forma alternativa de acesso à arte era imediatamente desqualificado pelos seus publicitários.
O nome que eles mais gostavam de usar era Pirata. Se alguém, com fome de arte, pulava uma de suas cercas para roubar um fruto musical que fosse, era atacado pelos seus cães de guarda, levado às autoridades e processado com o rigor da lei.
Seus empregados também não gostavam dele. Afinal eram usados como fantoches, fazendo apenas o que lhes era ordenado. De sua suada produção, eram tiradas pesadas porcentagens, lhes restando um mínimo que, por muitas vezes, lhes fazia pensar em desistir de tudo. Porém o Avarento detinha o poder de distribuição. Todos dependiam dele.
E assim vivia esse povo, ano após ano, década após década. O Avarento controlava a todos, produtores e consumidores. Mas as coisas começaram a mudar. Alguns consumidores descobriram uma forma de se alimentar dos frutos do Avarento sem serem descobertos. Alguns poucos produtores também tiveram coragem e passaram a produzir sozinhos e a vender seus frutos por um preço menor, à distância. Aos poucos mais e mais pessoas começaram a fazer o mesmo. As coisas realmente estavam mudadas.
Quando descobriu, o Avarento ficou furioso! Disse que se as coisas continuassem assim, sua fazenda iria acabar falindo, pois seria impossível manter o funcionamento sem o lucro de outrora. Seus publicitários trabalhavam como nunca, pensando numa nova forma de desqualificar essas pessoas. Ao mesmo tempo, as autoridades (sempre do lado dos mais fortes) puniam com rigor alguns poucos que eram descobertos, com a ajuda dos cães de guarda. Mas não adiantava: para cada um descoberto, milhares de outros se rebelavam contra o Avarento, cada vez mais avarento e desesperado.
Mas veio o Natal daquele ano. Apesar do momento de crise, a ceia do Avarento estava como sempre: farta e solitária. Porém nem tudo foi igual. Naquela noite ele viu alguém se aproximar, dentro de sua enorme mansão. Primeiro pensou que fosse um esfomeado, visto que se vestia mal. "Quem é você?" perguntou ele. Antes que ele chamasse seus cães ouviu a resposta "Sou o fantasma do Natal passado".
Ao iluminar bem percebeu uma figura, meio Jerry Garcia, meio John Lennon. Usava uma calça jeans surrada e uma camiseta velha com uma grande língua vermelha. Em suas mãos, uma sacola de uma antiga loja de LPs. "Eu sou o fantasma do que costumava ser o natal para aqueles que gostavam de música" disse ele. "Em um tempo onde todos presenteavam compactos, LPs e depois CDs. Você não era assim e nos proporcionava preços acessíveis aos seus produtos. Mas o tempo passou, você ficou velho, egoísta e presunçoso. Por isso assim lhe chamam, Avarento.”
"Mas todos apenas querem roubar meus frutos" retrucou ele. "O que faço é distribuir a produção de todos e claro, cobro a minha taxa para isso" continuou. Nesse momento, o espectro pôs a mão na sacola e puxou lá de dentro um compacto de Rocket 88, de Ike Turner.
Os olhos do Avarento arregalaram-se na hora. Em seguida ficaram mareados. Havia sido aquele o primeiro disco que comprara nos já distantes anos 50. Lembrou-se de sua juventude, de um tempo em que queria apenas distribuir a música. Lembrou-se de sua primeira banda, onde era baterista. Depois sua primeira propriedade que cresceu até engoliu sua ideologia.
Quando olhou de novo, o espectro havia partido, mas o compacto ficara. Tirou o pó da velha eletrola e ficou ouvindo de novo e de novo, até o raiar do sol. Raiava junto um novo dia. O Avarento não era mais avarento. Seguiu para seus depósitos e mandou que seus guardas abrissem os portões. O povo então fartou-se de música e arte como nunca havia sido possível. Os artistas viam suas obras sendo apreciadas e passaram a produzir ainda mais. As coisas finalmente mudaram.
Ao Avarento, mudou a alcunha. Agora chamavam-no de Bom Velhinho. Seus publicitários precisaram esforçar-se um pouco mais, agora para encontrar outras formas de manter a fábrica funcionando, mas ainda com lucro, assim como para os produtores. Seus cães de guarda precisaram encontrar outras maneiras de viver e passaram a caçar pedófilos e racistas, que ainda habitavam aquelas terras. Os tempos haviam mudado.
...E todos viveram felizes para sempre, com muito rock and roll!
E lembre-se: All we need is love!
Feliz Natal para todos!
2 comentários:
Adorei!! não é necessário, nenhuma palavra a mais... A D O R E I !
All we need is love!
E de coragem tb!
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